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15/12/2011

Riscos declinados. Por quê?

riscos que não são mais aceitos pelas Seguradoras e também pelos Resseguradores, desde a abertura do mercado de resseguro ocorrida em 2008. Corretores de seguros têm reclamado que segmentos inteiros deixaram de ser cobertos pelos seguros, o que antes não acontecia à sombra do monopólio exercido pelo IRB-Brasil Re. Quais as razões para este fenômeno e de quem é a culpa por esta situação que se apresenta? Há, de fato, culpados neste cenário? Quem são eles? Respostas para as questões levantadas não são tão simples na busca de soluções plausíveis e podem, inclusive, apresentar várias vertentes.

estar diante de riscos que realmente não condizem com as boas práticas de prevenção de danos e a negativa de cobertura era esperada para eles, tão logo houvesse a desmonopolização do resseguro. O IRB-Brasil Re, em grande parte de sua existência monopolista, ditou as regras e os preços para as seguradoras do Brasil, e, ao invés de apenas oferecer as bases de aceitação para fins de resseguro, acabou parametrizando as bases do seguro direto sempre.

Com a quebra do monopólio este comportamento acabou, evidentemente, e o mercado ainda não se adaptou em face dos novos parâmetros. Os maus riscos não terão cobertura, em hipótese alguma, nunca mais. Esta é a realidade que muitos não querem ouvi-la. Havia empresas estatais, ou melhor, há empresas estatais e também empresas privadas neste país em péssimas condições técnicas, isso é inegável, verdadeiras sucatas sem manutenção e modernização alguma e certamente não encontrarão mais Seguradoras dispostas a cobri-las.

As Seguradoras, atualmente, dependem de bons resultados de seus contratos de resseguro para conseguirem renová-los em boas condições e com capacidades cada vez maiores para fazerem frente à concorrência mais acirrada. Antes, no monopólio, as bases de resseguro sendo iguais para todas elas, não tinham o resultado da carteira como parâmetro essencial para renovações de resseguro, até porque o IRB-Brasil Re suportava todas elas.

Este padrão acabou para sempre e assim se dá no mundo todo e será no Brasil também daqui para frente. As "gorduras" generalizadas que existiam nos prêmios, compensando os maus pelos bons riscos, foram e continuam sendo eliminadas e os preços mais baixos não permitem que a Seguradoras aceitem riscos que apresentem quadro de exposição fora dos padrões de normalidade que elas determinam e juntamente com os Resseguradores delas. Não é diferente no resto do mundo a eliminação sumária dos maus riscos dos portfolios das Seguradoras e dos Resseguradores. Há, inclusive, não para os maus riscos, mas essencialmente para determinados riscos de alta exposição e que também acabam tendo dificuldades de coberturas através dos mercados tradicionais de seguros e resseguros a criação de outros mecanismos garantidores, assim como Cativas e Fundos de Autogestão de riscos.

Nem todo risco é segurável através dos padrões tradicionais, portanto. Essa é uma nova realidade que chega agora também ao Brasil. Vários desdobramentos ocorrerão sobre este tema e todos eles precisam ser devidamente apreciados e estudados em bases técnicas e jurídicas razoáveis e condizentes com os respectivos interesses e em face das possibilidades que podem ser materializadas. Não prosperará a pretensão de que tudo seja resolvido através do seguro tradicional, a qualquer custo.

Não é assim que funciona no mundo todo e não funcionará também no Brasil. Há outros meios e certamente lícitos e razoáveis e possíveis e também já experimentados em outras partes do mundo. Há teses doutrinárias diversas sobre este tema e até mesmo a de que o IRB-Brasil Re, permanecendo como estatal neste mercado, teria obrigações remanescentes em relação a riscos que não são colocados nos demais Resseguradores e justamente porque eles declinaram os negócios. Somos contrários a este pensamento e doutrina, até porque sempre entendemos que o Decreto-lei n.º 73/66 admitia que o IRB não fosse obrigado a aceitar riscos durante o monopólio e, não o fazendo, era apenas obrigado a permitir que o interessado o colocasse no exterior, caso existisse Ressegurador favorável àquela operação negada por ele.

Por que seria diferente contemporaneamente e até porque o IRB-Brasil Re, se uma estatal de fato, ele continua mantendo o dever de ser eficiente, tal como determinou a Constituição Federal de 1988, no seu artigo 37. Na atividade de seguros e também na de resseguros, a eficiência passa pela política de aceitação de riscos: (i) postura técnica; ou (ii) postura temerária e certamente com grande possibilidade de se tornar ruinosa, caso seja abraçada a segunda hipótese. Se o IRB-Brasil Re aceitar ou for obrigado a aceitar qualquer tipo de risco indiscriminadamente, não importando a qualidade técnica de cada um deles individualmente, o mencionado princípio da eficiência administrativa, inserto na CF, será inquestionavelmente comprometido e isso seria contrário ao ordenamento jurídico posto, cabendo a responsabilização devida dos administradores da empresa. Não há exceção constitucional ao IRB-Brasil Re ou a qualquer outra empresa sob o controle estatal. No livro de nossa autoria, "Contrato de seguro: novos paradigmas", São Paulo: Roncarati, 2010, propusemos a discussão do tema da aceitação de riscos, porém sob o viés da obrigatoriedade ou não da Seguradora aceitar riscos a partir de parâmetros objetivos determinados por ela e uma vez plenamente atingidos pelos proponentes dos seguros. A partir da página 338 do livro, discorremos sobre essa questão, com vistas no CDC e seus ditames.

Não a esgotamos evidentemente, até porque seria impossível atingir este objetivo. Traçamos determinados paradigmas de observação, instigando a reflexão sobre algumas possibilidades: no art. 39, II do CDC, em conjunção com os artigos 30 e 35 há praticamente uma obrigação de contratar; o fato de o consumidor se enquadrar nos parâmetros objetivos traçados pela Seguradora para a aceitação do risco; etc. Pequeno o ensaio e nada pretencioso, mas é um começo e não havia nada sobre este tema até então, no país, em matéria de seguros.

Essa questão e o estudo mencionado passam muito mais pelos direitos dos consumidores em matéria de seguros de massa, de interesse essencial para a coletividade. Não tratam, do mesmo modo, dos seguros para os riscos de médio e grande porte, os quais devem estar sujeitos a outros regramentos e, com maior intensidade, devem obedecer a determinados padrões mínimos de segurança e prevenção de riscos para terem a aceitação deles confirmada.

e qualquer maneira, todo o processo passa pelos critérios objetivos de aceitação e de recusa dos riscos e eles, na atualidade, devem ser os mais transparentes possíveis para os consumidores, de qualquer porte. A relação Proponente-Seguradora deve ser cada vez mais objetiva, transparente e perfeitamente técnica. O mercado brasileiro deverá trilhar por muitos desafios e mudanças ainda, desde a abertura do resseguro.

Muitos percalços surgirão no caminho, mas nenhum deles que possa mudar o rumo ao desenvolvimento em face da importância que tem hoje o seguro para a sociedade pós-moderna. Qualquer mudança de regra impingida de maneira antidemocrática apenas impedirá que os objetivos sejam alcançados mais cedo, mas não conseguirão protelar essas metas para sempre.

O que não é razoável não tem vida perene. O mercado segurador nacional precisa de muito estudo, de muita reflexão sobre o tempo perdido nas últimas décadas, de quase total obscurantismo, compensando-se tecnicamente. O tempo é outro. Já não se pode fazer seguro como se fazia antigamente. A atividade seguradora está sob o comando de outros paradigmas, de outro pensamento contratual. A sociedade em geral e o consumidor individualizado têm outro olhar para o seguro e eles ditam as regras, segundo os seus interesses.

A relação é completamente diferente, portanto, se comparada a duas ou três décadas atrás. O contrato de seguro, inclusive, não é e não pode ser apenas mais um produto ou serviço simplificado e massificado como qualquer outro encontrado nos balcões dos bancos. Não é essa a sua natureza comercial e jurídica. Quando o mercado segurador nacional reclama do fenômeno que ele mesmo denominou de "judicialização do seguro", tentando atribuir ao Judiciário todas as mazelas e incongruências pelas quais as Seguradoras passam no dia a dia, ele se esquece de proceder à necessária autorreflexão, questionando o porquê do expressivo volume de ações judiciais contra o sistema.

O tempo é outro, repita-se. Outros mercados já passaram por essa transição, de sistema fechado para aberto, alinhados também ao fato de que as próprias sociedades tiveram desenvolvimento não só através de mais acesso à educação, como também pelo fato das condições econômicas terem melhorado para muitos. O mesmo movimento modernizante pelo qual passaram as Seguradoras Europeias a partir do final dos anos 70 chega agora ao Brasil e certamente será concretizado com o mesmo sucesso e alto padrão tecnológico.

Muitos dos problemas e cenários encontrados no mercado europeu naquela década são hoje refletidos no mercado brasileiro, apesar do tempo decorrido. De qualquer maneira, assim como os europeus ultrapassaram tudo aquilo que não os permitiam saltar para o futuro e para a modernidade, também os brasileiros alcançarão o mesmo patamar. Há muito que ser feito, contudo, e rapidamente. O tempo não para.

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