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Ainda sobre as Resoluções 224 e 225/2010 do CNSP
Walter Polido
A quem interessa, foi a pergunta apresentada no texto anterior. Vários outros articulistas ensaiaram respostas. E todos eles foram unânimes na afirmação de que quem perdeu com a mudança de procedimentos foi o Brasil. Foi também o processo, antes democrático, da abertura do mercado de resseguro, o qual buscava a sua natureza essencial, depois de longas décadas de afastamento e atraso: a internacionalidade. Mas afinal por que, então, houve a mudança do rumo anteriormente traçado e determinado pelas autoridades reguladoras do sistema? A resposta é bastante óbvia: o Brasil não convive bem com o progresso e as forças conservadoras o prendem, sempre, aos grilhões do atraso.
Essas forças conservadoras, evidentemente, auferem lucros e especiais privilégios no cenário de estagnação. Lucros quando as forças são provenientes da iniciativa privada e privilégios, nem sempre lucrativos, quando direcionados às entidades estatais. Elas enriquecem; o país, entretanto, empobrece e não avança.
O Estado, por sua vez, incha, mas não consegue suprir adequadamente os usuários dos serviços por eles exigidos e tão pouco com a qualidade também necessária.
Não ultrapassamos os contornos da América Latina, permanecendo fechados para o resto do mundo. Maldição dos colonizadores que aqui sempre espoliaram, sem qualquer preocupação com o estabelecimento de um novo país, de uma nova nação democrática, progressista e livre? Talvez sim, pois que não há razão mais concreta para essa lamentável sina.
O Brasil e o mercado segurador nacional não conseguiram ultrapassar a mentalidade construída no final do século XIX, enquanto que os países desenvolvidos estão no século XXI e outros tantos para lá se encaminham, a passos largos. Para galgarmos o século XXI precisamos nos desapegar de determinados princípios e práticas construídas em outras épocas, totalmente inconcebíveis nos dias de hoje.
As bases do Governo que se encerrou buscaram a nacionalização da economia, enquanto que os países líderes já descobriram há muito tempo atrás que o segredo do desenvolvimento está justamente na base oposta, ou seja, na internacionalização. Representamos pouco ou quase nada no comércio global e chegamos perto da cifra insignificante de 1%. Não há, contudo, política pública que anteveja mudanças nessa trajetória. Aliás, não temos políticas públicas em nenhum setor do país e este paradigma nefasto nos atola no atraso, no subdesenvolvimento. Neste verão, enterraremos centenas de mortos pelas tragédias climáticas ocorridas nos vários Estados brasileiros e, sem política de prevenção também nesta área, resta-nos apenas esperar pela próxima estação, com menos chuvas. Entretanto, protagonizaremos as bilionárias Copa do Mundo e as Olimpíadas em curto espaço de tempo, sob os largos e esfuziantes sorrisos, com muita alegria, dos mesmos governantes que se omitiram e que provavelmente continuarão se omitindo diante das mencionadas tragédias desde há muito anunciadas.
O povo brasileiro é realmente muito alegre. Na verdade, precisaríamos sim de uma dose mais forte de seriedade e de menos risos patéticos. Como mudar isso? Só com educação maximizada, nas próximas gerações, iniciando o processo agora, sem mais delongas e procrastinações criminosas dos governantes. Sim, há responsabilidade civil de cunho ético-político nesta questão. Todos os governantes deveriam ser responsabilizados civil e criminalmente pelo ilícito praticado de subtração da educação do povo.
Criminalmente pois que há flagrante estelionato eleitoral nessa questão, imputável a todos os representantes das esferas administrativas do país: União, Estados, Municípios e Distrito Federal. Sem educação, não atingiremos nenhum patamar melhor do que este que se apresenta.
O povo precisa conhecer, ter crítica acentuada para então poder votar conscientemente. Sem educação perpetuar-se-á o status quo, para a felicidade de alguns em detrimento dos interesses legítimos do povo em geral. Só pela educação mudaremos essa lamentável e antidemocrática equação: pagamos impostos no mesmo nível de país desenvolvido e recebemos em contrapartida serviços de país atrasado. Não há outro caminho, portanto, que não passe pela educação do povo. Só assim alcançaremos o estágio de um país democrático de direito. Mas o que tudo isso tem a ver com as Resoluções 224 e 225/2010 do CNSP? Ora, tudo a ver.
Elas foram emanadas a partir desses mesmos paradigmas reinantes no país, elaboradas pelas hordas burocráticas do atraso, quer de natureza privada quer de natureza estatal, pois que no Brasil elas se misturam e ambas têm o mesmo poder nefasto que dizima o progresso. A ausência completa de uma política econômica para o setor de seguros do país, quer no âmbito privado, quer no âmbito público-governamental propicia este tipo de coisa: burocratas do atraso se manifestam, sem conhecimento de causa, sem perspectiva cientificamente planejada e testada de seus atos, contribuindo para que permaneçamos no nada, certos da impunidade de seus atos.
Em país desenvolvido o seguro e seu significativo mercado fazem parte das agendas governamentais. Eles sabem que além da poupança nacional que a produção de seguros representa, não só diante das provisões técnicas de suas seguradoras, mas também em razão da prevenção de acidentes e da garantia de interesses vários dos cidadãos segurados, o mesmo mercado movimenta outros tantos setores financeiros e suprem ou complementam grande parte das parcelas de responsabilidades dos próprios governos: como nos serviços de saúde, por exemplo.
No Brasil, por sua vez, todo o segmento é tributado pelo Governo, com a nítida demonstração de total ignorância das bases fundamentais do sistema securitário. E os agentes reguladores estatais, o que fazem a respeito em prol do país? Bem, sobre isso outros tantos artigos necessitariam ser elaborados.
Uma simples referência pode resumir a necessidade deste setor: artigo 37 da Constituição Federal da República – serviço eficiente, com pessoal tecnicamente capacitado e dirigido por profissional com notório e comprovado conhecimento da área. E o resseguro? Bem, ele precisa continuar livre, tal como é a sua essência. Não há como “nacionalizá-lo” novamente, assim como Getúlio Vargas procedeu em 1939, quando criou o Instituto de Resseguros do Brasil e o fez por outras razões, evidentemente. O mundo é outro. Os saudosistas dos tempos idos devem ir para casa, trancando-se nelas e de forma hermética, de modo mesmo a não cometerem mais desatinos, ainda que tenham poderes instituídos para tal. Deixem o Brasil prosperar.
Deixem o país sair do patamar que nos encontramos, do atraso. Deixem-nos respirar o novo. O mercado ressegurador brasileiro, em apenas dois anos de abertura, a partir da Lei Complementar n.º 126/2007, se fortaleceu rapidamente, com mais de noventa empresas registradas na Superintendência de Seguros Privados. Os procedimentos, antes monopolizados pelo IRB, passaram por mudanças significativas, rumo aos modelos internacionais. Este é o paradigma encontrado em todos os demais países, não podendo ficar de fora o Brasil.
Novos produtos de seguros passaram a fazer parte dos portfolios das Seguradoras, especialmente daqueles comprometidas com a onda evolutiva do mercado. Se outras tantas, não igualmente comprometidas se sentiram prejudicadas, não podem servir de baliza para o restabelecimento de regras, ou seja, não podem protagonizar o retrocesso, de modo a se sentirem novamente em zona de total conforto. Elas não evoluirão este mercado, mantendo-o no estágio no qual se encontra. Então, também elas precisam investir na modernidade, no desenvolvimento do mercado primário de seguros. Não podem constituir forças ocultas do atraso, amarrando o país no mesmo patamar apenas para elas continuarem a se locupletar neste atual estágio de subdesenvolvimento. Ora, o mercado brasileiro de seguros precisa se modernizar.
Precisa alcançar patamares que ainda não alcançou. Precisa sair do ostracismo e passar a fazer parte das agendas dos governantes do país, assim como o sistema financeiro já faz há muito tempo. Precisa se profissionalizar de forma objetiva. Precisa ampliar a sua penetração junto às diversas camadas da sociedade brasileira, muitas delas ainda não atendidas pelo segmento. Precisa ter Instituições fortes e representadas por profissionais preparados tecnicamente.
Precisa expandir para o exterior, via resseguro, pulverizando os riscos brasileiros e em troca trazer novas tecnologias de prevenção e de subscrição de riscos. Precisa abandonar os paradigmas do pensamento construídos no final do século XIX, sob a ótica da liberdade absoluta contratual, lançando-se de vez para o século XIX, sob outros fundamentos: o respeito ao consumidor de seguros; a relativização contratual; a essencialidade do seguro na sociedade pós-moderna.
Não podemos mais permitir que ações como estas imprimidas pelas citadas Resoluções do CNSP simplesmente prevaleçam sem contestações mais apuradas. Há que existir confronto saudável entre os agentes interessados do sistema e o poder público regulador. Se não prevalecer o bom senso, diante das evidências da impropriedade das novas regras, assim como acontece em qualquer país democrático e civilizado, que o tema seja submetido ao Poder Judiciário. Afinal há unanimidade no entendimento de que os referidos atos administrativos “modificaram” e não apenas “regulamentaram” a Lei Complementar 126/2007, ao arrepio do Direito constituído.
Isso não pode mais acontecer no atual estágio de nosso mercado e do nosso país. Precisamos nos colocar na situação de cidadãos da República e não aceitarmos, de forma alguma, a condição de meros súditos, a serviço da Administração Pública, nem sempre preparada e eficiente tal como determina principiologicamente a Constituição Federal. A Resolução que “esmigalhou” o processo de retrocessão no país entrará em vigor no início do próximo mês. A quem interessa de fato este retrocesso normativo? Somente aos agentes do atraso: privados e estatais.